Todos os jogos de beber são parvos.
Todos.
A “mão direita ser penalti”.
O X querer ou não “ser cá da malta”.
Todos os jogos de beber são parvos e são evoluções naturais do brinde. O brinde não é mais que um reconhecimento da amizade e carinho que se tem pelas pessoas com quem se choca o copo e pelo tema pelo qual se choca o copo. As variações vieram em anos posteriores. As ressacas vieram em manhãs posteriores.
No entanto, há uns jogos mais primitivos e primários que outros. Há jogos elaborados, como a Árvore das Patacas, o Anel de Fogo ou o Ping. E há jogos estúpidos e medievais. Como o… “vamos ver quem bebe primeiro este copo todo”.
Quero dizer, em jeito de lançamento dos parágrafos seguintes, que não bebo para ficar bêbado. Acho uma noção parva, deprimente e totalmente desprovida de bom senso. É assim que as pessoas acabam alcoólicas ou presas quando só começaram parvas ou com sede.
Nessa noite eu já estava tocado, verdade. Não nego. Tenho um esquema com um amigo que é simples e saudável. Da frequência normal daquele carro só nós os dois temos carta, portanto se ele bebe, eu não. Se eu bebo, ele não. E vamos alternando. Para sorte dos conduzidos e azar do me fígado, era a vez dele de conduzir. E apenas tocado tinha aceite um desafio daqueles. Espero eu.
No meio do “Deck”, ao lado da Marina, estavam com um indivíduo que a partir desta linha se chamará S. S é dos maiores bebedores que já vi na minha vida. E não esconde. Aliás, mesmo que quisesse, as histórias, os números e as estatísticas hão de o perseguir enquanto ele conseguir pegar num copo. E surrupir o que lá dentro estiver.
Nos bares do “Deck”, e não me perguntem porquê, há duas variantes de copos de cerveja. Um copo de 33cl e um copo de 75cl. S iluminou-se como o estádio do Benfica em dia de derby quando ouviu falar da segunda variante. “Desafio-te…” foi a palavra que mudou a minha noite.
Basicamente, e para saltar um pouco de suspense directamente para a acção, ambos acabámos com um copo de 75cl na mão, a olhar olhos nos olhos o nosso oponente. Só para terem uma noção ao ler isto da quantidade de cerveja, o copo pesa. Nunca tinha bebido de um copo que pesasse. Quando uma pessoa nota o peso do copo pelo qual está a beber, sabe que algo já está errado.
Em “3, 2, 1…” eu e S começámos a fazer desaparecer a cevada fermentada. Não tenho noção de quanto tempo demorou a “batalha”, nem de quantos golos tive de dar, nem da minha figura para quem passava ao nosso lado. Sei que ganhei. E sei que “arroto” ganhou uma nova conotação na minha vida.
Quem bebe cerveja, para além de ter barriga, sabe que quando se subtrai a sua essência depressa demais, ar condensado sobe até à nossa garganta. Mas quem bebe cerveja não tem noção do que é um arroto provocado por 75cl de cerveja bebida quase de penalti. Não foi, porque não queria que na minha lápide dissesse: “Aqui jaz Guilherme, que morreu afogado com cerveja enquanto tentava ganhar apenas honra, sim não havia dinheiro envolvido na aposta, era apenas honra.”
Os arrotos pareciam soluços. Vinham entre golos, depois de golos e antes de golos de cerveja. Para bem da minha vitória e resultado, nunca vieram durante golos de cerveja. Que fique registado que eu, Guilherme Fonseca, ganhei a S a ver quem bebia 75cl de cerveja mais depressa. Que fique registado que o meu orgulho está envergonhado e que vai voltar para dentro. Obrigado.
(ADENDA: No final, como bons otários e bebedores que somos, fizemos um “double or nothing” de desforra - o S merecia, tinha uma imagem a limpar – com um copo de 33cl. Esse resultado pouco importa, como o leitor mais competitivo sabiamente saberá mas aqui fica registado, para o caso do Guiness aqui passar, que S ganhou. Ele é campeão dos “copos leves”, eu dos “copos pesados”.)
Apenas uma dúvida me permanece daquela noite. Não é se a diversão do momento se sobrepôs à estupidez e infantilidade do acto, não. Não é se o gesto fez de mim o macho alfa do meu grupo de amigos, não. Nem é se aos 40 anos vou lamentar aquela noite quando estiver no ginásio a chorar por dentro por causa da minha barriga protuberante, não. É apenas e só se hei de pôr este resultado no meu Currículo Vitae.
Wednesday, August 19, 2009
All garve and no lisbon make Gui a Happy Boy #2
Etiquetas:
algarve,
escrita,
histórias,
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sinceridades
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1 comment:
O problema é que estas brincadeiras não vos destroem o fígado nem os neurónios. O ambiente, esse sim, fica todo fodido.
Long Live S.
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