“Nove” – …são os segundos durante os quais o filme é tolerável
CONTRA PICADO/GF – A sensação que eu tive ao ver este filme foi a mesma de estar em casa, sossegado a ler Goethe, e descobrir pela televisão que Eric Rohmer tinha morrido. (Enquanto que no Indesmentível me acusavam de votar em Sócrates.) Não está a ser uma semana feliz, a começar na morte de Eric Rohmer, passando pelo terramoto no Haiti e acabando na novidade de que cada concorrente do Ídolos irá cantar duas músicas por gala. Infeliz e triste é o facto de, na semana em que morre um dos deuses do cinema que foi Rohmer, estreia um musical do calibre de “Nove” nos cinemas. É tão insultuoso como se no dia em que morreu Jim Morrison, os D’ZRT tivessem lançado um novo single. Vou ter saudades de Rohmer e dos seus deliciosos diálogos filosóficos cravados com paixão na película. Nem levo a mal algumas declarações de Rohmer em que, por exemplo, defendeu o “Cinema clássico americano” ou apontou Alfred Hitchcock como “um bom cineasta”.
São pequenos erros que nos lembram que, apesar do seu cinema, Rohmer era apenas um ser humano. E por isso mesmo é triste estar de luto, ir ao cinema ver a estreia da semana e levar com desafinadas miadelas de Nicole-eu-da-última-vez-que-cantei-morri-de-tuberculose-pode-ser-que-se-repita-Kidman. Sabem que mais? Hollywood começa o ano a dar-nos uma importante lição de vida: Se não têm nada para dizer, digam-no cantando. Assim, disfarçam o facto do vosso filme ser oco e ainda conseguem ganhar uns Óscares. “Nove” não é mais que o sonho molhado de um La Féria americano que no fundo, gostava de ser júri do Ídolos. Dantes, quem cantava, seus males espantava. Agora, quem canta, sua qualidade espanta. O cinema não é o chuveiro de ninguém, meus amigos. A música tornou-se a pornografia do Séc. XXI e não há “garganta funda” que nos ponha a “dançar”. O cinema é uma arte deslumbrante em que, cada vez mais, pessoas como Eric Rohmer nos deixam e indivíduos como Rob Marshall nos assombram. Cheira-me que me vou fechar na cinemateca uma boa semana, só com cigarros de enrolar no bolso. Chamem-lhe “luto”, “desintoxicação” ou “terapia”. Como quiserem.
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CONTRA PICADO/GF – A sensação que eu tive ao ver este filme foi a mesma de estar em casa, sossegado a ler Goethe, e descobrir pela televisão que Eric Rohmer tinha morrido. (Enquanto que no Indesmentível me acusavam de votar em Sócrates.) Não está a ser uma semana feliz, a começar na morte de Eric Rohmer, passando pelo terramoto no Haiti e acabando na novidade de que cada concorrente do Ídolos irá cantar duas músicas por gala. Infeliz e triste é o facto de, na semana em que morre um dos deuses do cinema que foi Rohmer, estreia um musical do calibre de “Nove” nos cinemas. É tão insultuoso como se no dia em que morreu Jim Morrison, os D’ZRT tivessem lançado um novo single. Vou ter saudades de Rohmer e dos seus deliciosos diálogos filosóficos cravados com paixão na película. Nem levo a mal algumas declarações de Rohmer em que, por exemplo, defendeu o “Cinema clássico americano” ou apontou Alfred Hitchcock como “um bom cineasta”.
São pequenos erros que nos lembram que, apesar do seu cinema, Rohmer era apenas um ser humano. E por isso mesmo é triste estar de luto, ir ao cinema ver a estreia da semana e levar com desafinadas miadelas de Nicole-eu-da-última-vez-que-cantei-morri-de-tuberculose-pode-ser-que-se-repita-Kidman. Sabem que mais? Hollywood começa o ano a dar-nos uma importante lição de vida: Se não têm nada para dizer, digam-no cantando. Assim, disfarçam o facto do vosso filme ser oco e ainda conseguem ganhar uns Óscares. “Nove” não é mais que o sonho molhado de um La Féria americano que no fundo, gostava de ser júri do Ídolos. Dantes, quem cantava, seus males espantava. Agora, quem canta, sua qualidade espanta. O cinema não é o chuveiro de ninguém, meus amigos. A música tornou-se a pornografia do Séc. XXI e não há “garganta funda” que nos ponha a “dançar”. O cinema é uma arte deslumbrante em que, cada vez mais, pessoas como Eric Rohmer nos deixam e indivíduos como Rob Marshall nos assombram. Cheira-me que me vou fechar na cinemateca uma boa semana, só com cigarros de enrolar no bolso. Chamem-lhe “luto”, “desintoxicação” ou “terapia”. Como quiserem.
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